
A história do Christopher McCandless ficou muito conhecida nos EUA devido ao best-seller do jornalista Jon Krakauer (autor de outro sucesso literário, No ar rarefeito). O escritor realizou uma pesquisa ampla sobre a vida errante desse rapaz que decidiu abandonar a família, a vida cotidiana típica, em busca de um retorno às origens (o que significava para ele a vida em ambiente selvagem, sem presença humana).
Chris não consegue de fato realizar tal feito. Mesmo o ônibus que escolheu para servir de abrigo em sua derradeira temporada de verão no Alasca é sinal disso. A mão do diretor Sean Penn foi certeira em demonstrar este aspecto do livro: de que o próprio Chris fazia concessões em seu radicalismo para sustentar esse resgate de vida primordial.
O bacana do filme é a tentativa do roteiro e da direção em demonstrar que há também um percurso literário de Chris, presente nas cartas e postais que envia a vários colegas e amigos de estrada. As citações e aforismos, selecionadas por Chris em seus livros favoritos, misturam-se a seu próprio discurso, o que foi evidenciado pela pesquisa de Krakauer e tentou ser preservado de alguma maneira (suave maneira) no filme.
Escritores citados por Chris, que pregavam a fuga para a natureza ou para a situações-limite como meio de autoconhecimento e experiência (leia-se London, Thoreau, Pasternak etc), reforçam a pertinência da temática do filme, já que são escritores re-traduzidos e, meia-volta, comentados pela atualidade dos temas tratados em suas obras.
O filme reforça essa evidência de que, em algum momento, a coisa desandou, a sociedade perdeu o rumo. Daí, a busca de McCandless resvalar na busca de um status de Self-Made Man, emblema tipicamente norte-americano e precursor da figura glamurosa do colono pioneiro, semi-nômade, que busca seu lugar no mundo e na terra. Por isso, tanto no filme quanto no livro, não há tentativas de aproximar as ações de Chris como a de um andarilho hippie ou de um mendigo ou de um imigrante pobre. O trocadilho de seu alter-ego (Alexander Supertramp - algo como super vagabundo, tradução minha) demonstra a glamurização dos personagens presentes principalmente na literatura de Jack London.
Paradoxalmente à sua escolha pela reclusão e o nomadismo, o estilo egocêntrico, grandiloqüente do rapaz, que aparece envolto em uma névoa de um excêntrico fascínio, surpreendia e afetava diretamente todos que conhecia. O mesmo fascínio que o diretor tenta manter durante o filme. Há, derivadas deste aspecto, ótimas cenas, como o encontro de Chris com veterano da 2a. Guerra Ronald Franz (interpretado por Hal Holbrook, indicado ao Oscar de melhor ator coadjuvante em 2008 pela atuação).
Alguns elementos auxiliam a direção neste sentido: a excelente fotografia, que certamente é o maior acerto (as paisagens durante as andanças de Chris - a pé, de carro, de caiaque, de trem - aproximam o filme do gênero dos road movies); a nervosa trilha sonora (folk à la Neil Young), composta por Eddie Vedder (vocalista do Pearl Jam), que insinua uma relação entre a adesão de McCandless à vida errante (com exemplo e emblema) e o estado de revolta quase insciente e não menos violento do início dos anos 90 (cantado por um de seus porta-vozes). É curioso que não tenha achado nenhuma referência a este aspecto em todas as críticas que li sobre o filme.
O filme, assim, é tipicamente romântico (porém, sem exagero sentimental). Há o escapismo (para a natureza, como almejava outro romântico, Thoreau, um dos autores prediletos de Chris), há a reclusão e a solidão como formas de expressar esta fuga (da cidade, da cotidiano), há a morte.
Os pais ficarão constrangidos com o papel de Willian Hurt, que atua como pai de Chris no filme, ao mesmo tempo que adolescentes vão se identificar de imediato com a relação conflituosa entre os dois (aqui, sim, repetição exaustiva de um mote do cinema americano). Mães e esposas chorosas vão se identificar com a mãe de Chris (Marcia Gay Harden). Afinal, é impossível justificar aos parentes de pessoas que se jogam neste tipo de experiência ações e posturas que beiram, segundo Krakauer, a irracionalidade.
É, gostei muito do filme.
Sobre o livro, falo depois.
Chris não consegue de fato realizar tal feito. Mesmo o ônibus que escolheu para servir de abrigo em sua derradeira temporada de verão no Alasca é sinal disso. A mão do diretor Sean Penn foi certeira em demonstrar este aspecto do livro: de que o próprio Chris fazia concessões em seu radicalismo para sustentar esse resgate de vida primordial.
O bacana do filme é a tentativa do roteiro e da direção em demonstrar que há também um percurso literário de Chris, presente nas cartas e postais que envia a vários colegas e amigos de estrada. As citações e aforismos, selecionadas por Chris em seus livros favoritos, misturam-se a seu próprio discurso, o que foi evidenciado pela pesquisa de Krakauer e tentou ser preservado de alguma maneira (suave maneira) no filme.
Escritores citados por Chris, que pregavam a fuga para a natureza ou para a situações-limite como meio de autoconhecimento e experiência (leia-se London, Thoreau, Pasternak etc), reforçam a pertinência da temática do filme, já que são escritores re-traduzidos e, meia-volta, comentados pela atualidade dos temas tratados em suas obras.
O filme reforça essa evidência de que, em algum momento, a coisa desandou, a sociedade perdeu o rumo. Daí, a busca de McCandless resvalar na busca de um status de Self-Made Man, emblema tipicamente norte-americano e precursor da figura glamurosa do colono pioneiro, semi-nômade, que busca seu lugar no mundo e na terra. Por isso, tanto no filme quanto no livro, não há tentativas de aproximar as ações de Chris como a de um andarilho hippie ou de um mendigo ou de um imigrante pobre. O trocadilho de seu alter-ego (Alexander Supertramp - algo como super vagabundo, tradução minha) demonstra a glamurização dos personagens presentes principalmente na literatura de Jack London.
Paradoxalmente à sua escolha pela reclusão e o nomadismo, o estilo egocêntrico, grandiloqüente do rapaz, que aparece envolto em uma névoa de um excêntrico fascínio, surpreendia e afetava diretamente todos que conhecia. O mesmo fascínio que o diretor tenta manter durante o filme. Há, derivadas deste aspecto, ótimas cenas, como o encontro de Chris com veterano da 2a. Guerra Ronald Franz (interpretado por Hal Holbrook, indicado ao Oscar de melhor ator coadjuvante em 2008 pela atuação).
Alguns elementos auxiliam a direção neste sentido: a excelente fotografia, que certamente é o maior acerto (as paisagens durante as andanças de Chris - a pé, de carro, de caiaque, de trem - aproximam o filme do gênero dos road movies); a nervosa trilha sonora (folk à la Neil Young), composta por Eddie Vedder (vocalista do Pearl Jam), que insinua uma relação entre a adesão de McCandless à vida errante (com exemplo e emblema) e o estado de revolta quase insciente e não menos violento do início dos anos 90 (cantado por um de seus porta-vozes). É curioso que não tenha achado nenhuma referência a este aspecto em todas as críticas que li sobre o filme.
O filme, assim, é tipicamente romântico (porém, sem exagero sentimental). Há o escapismo (para a natureza, como almejava outro romântico, Thoreau, um dos autores prediletos de Chris), há a reclusão e a solidão como formas de expressar esta fuga (da cidade, da cotidiano), há a morte.
Os pais ficarão constrangidos com o papel de Willian Hurt, que atua como pai de Chris no filme, ao mesmo tempo que adolescentes vão se identificar de imediato com a relação conflituosa entre os dois (aqui, sim, repetição exaustiva de um mote do cinema americano). Mães e esposas chorosas vão se identificar com a mãe de Chris (Marcia Gay Harden). Afinal, é impossível justificar aos parentes de pessoas que se jogam neste tipo de experiência ações e posturas que beiram, segundo Krakauer, a irracionalidade.
É, gostei muito do filme.
Sobre o livro, falo depois.
Um comentário:
Belo comentário, meu caro.
Também gostei muito do filme. Uma boa proposta seria ler a "biblioteca McCandless". Acho que era mais ou menos isso:
Walden
Dr. Jivago
Taras Bulba
Uma antologia de contos de Tolstoi, com A morte de Ivan Ilitch, Felicidade familiar e A sonata de Kreutzer (esse saiu faz pouco tempo pela Ed. 34)
Também são citados Michael Crichton e Robert Persig.
Tem mais?
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